O
futebol, como é sabido, é muito útil e são tantos os seus méritos que me
dispenso de os enumerar. É verdade que semeia alegrias e tristezas e provoca
discussões impensáveis mas também é sustento de orgulho e de memórias, e
provedor da leitura de jornais e revistas ajudando no combate à iliteracia. É,
aliás, o grande tema do plano nacional de leitura para adultos.
Mesmo
grandes escritores, como o Nobel Camilo José Cela, que em jovem ainda se
aventurou como extremo esquerdo, escreveram sobre futebol. Veja-se, da sua
autoria, a obra, cheia de humor, “Onze contos de futebol”, que custa uma
bagatela e se pode ler numa tarde de sol na praia, sem riscos para a saúde.
Por
estes dias, o futebol, deu mais uma prova da sua inequívoca capacidade,
mostrando uma eficácia que envergonha a oposição porque conseguiu afastar três
secretários de estado e alguns assessores e suplanta o governo porque provoca o
temeroso silêncio de alguns destacados membros da oposição. É obra! Como se vê
o futebol, mesmo no defeso, é extremamente eficaz.
O
futebol e a política são, como está sobejamente provado, uma mistura perigosa,
em que a emoção e ambição se cruzam e em
que não se conhecem significativas fronteiras ideológicas. Recorde-se que, aqui
por Coimbra, tivemos o presidente de um clube de futebol nomeado diretor
municipal do urbanismo pelo presidente da Câmara de então, que exerceu o cargo
durante três anos perante o silêncio quase total dos autarcas de todos os
partidos políticos, da esquerda à direita.
O
medo de perder votos, “atacando” o dirigente do principal clube de futebol da
cidade sobrepôs-se à normal luta partidária e levou a que todos, por ação ou
omissão, acabassem por ser coniventes com essa insólita e grave situação.
Note-se que mesmo a nível social, numa cidade como Coimbra, apenas uma ou duas
vozes se levantaram na crítica e contestação a essa promiscuidade e é sabido
que sem censura social é difícil alterar este estado de coisas.
No
entanto o resultado final deste concubinato foi de tal modo desastroso para a
Câmara, para a cidade e para o clube de futebol em causa, que se acredita nunca
mais seja possível uma situação idêntica.
Mas
o futebol aí está pujante e a demonstrar-se útil, afastado daquela velha e
interessante discussão filosófica, sobre a utilidade do inútil. Claro que os
factos ensinam que será bom não exagerar na utilização do futebol pela política
e que não deixa de ser perigoso assistir àquelas sessões clubísticas em que
figuras políticas, particularmente deputados, são banqueteados com jantares e
discursos impossíveis dos presidentes dos “seus” clubes, que aplaudem
entusiasticamente.
É
que o futebol é útil mas também muito perigoso.
(Artigo
publicado na edição de 13 de julho, do Diário de Coimbra)
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