O
eleitor consciente do seu dever cívico e que sabia já haver candidaturas às
próximas eleições, decidiu começar uma empenhada busca de esclarecimentos para
uma decisão ponderada e consciente. Para além dos fáceis gosto e das partilhas
do facebook não queria deixar, em matéria como esta, de tomar decisão informada
e de ir votar.
Foi
assim que encontrou referências a uma já ativa candidatura, apoiada por quatro
partidos e forças políticas, cujas siglas apareciam nos cartazes esmagadas pelo
candidato comum, que vinha declarando distancia dos partidos e intenção de
constituir uma equipa com independentes.
Claro
que o eleitor estava curioso e confuso. Mas a política tem destas coisas, tão
depressa se agregam partidos e se apela à fraternidade universal com se
excluem os pobres que aceitam o grande arquiteto da coligação.
Outra
coisa que intrigou o eleitor foi ver, no meio de tanto ativismo, discursos
repetidos sem pingo de novidade. Para a apregoada salvação da cidade não se
percebia quais os principais desígnios nem as grandes medidas políticas. O que
contava era a crítica e a acusação sem critério. É verdade que até às eleições
haverá tempo para um programa claro, bem desenhado e fundamentado, ainda que
não seja fácil com tantos partidos apoiantes e tantos ambicionados
independentes.
Para
já havia por ali muita oscilação, muita tremura e confusão de ideias. Mas todas
as coisas têm o seu tempo, como vem na Bíblia.
Estava
o eleitor neste emaranhado de dúvidas e interrogações quando olhou com atenção
e percebeu que tinha, por lapso, misturado na sua leitura informações sobre a
candidatura e um artigo sobre bicicletas. Da confusa candidatura tinha saltado
para o desenho e características do selim, o tipo de mudanças (com um nome
japonês), o tamanho das rodas, o sistema de travagem, o modelo mais adequado ao
uso na cidade ou os modelos indicados para todo o terreno. Tudo coisas sobre
bicicletas.
Como
sabem os leitores estes acasos levam muitas vezes às grandes descobertas, às
grandes ideias ou às mais intrigantes dúvidas sobre a origem do universo ou a
natureza dos candidatos.
Instintivamente
percebeu que havia ali qualquer coisa de premonitório.
Depois
de se revolver em interrogações lembrou-se que uma coisa essencial numa
bicicleta é o equilíbrio. O equilíbrio dos seus componentes e a capacidade de
equilíbrio do seu utilizador. Uma solução anárquica, com carretos desajustados,
rodas desconformes e sem adequado sistema de travagem é um problema. Ainda, por
cima, se o condutor pedala aos zig-zag sem saber para onde verdadeiramente quer
ir, dá mau resultado.
E
foi assim que o consciencioso eleitor, que pretendia aproveitar as férias para
se ir informando e adquirindo uma ideia segura sobre o futuro sentido do seu
voto acabou ali, naquele momento, por chegar a uma inesperada conclusão: tinha
confundido uma candidatura com uma bicicleta.
Talvez
não tenha sido um mero acaso mas uma relevante coincidência. Agora ia esperar
para ver quantos tombos o impulsivo ciclista não iria dar até outubro.
(Artigo
publicado na edição de 15 de junho, do Diário de Coimbra)
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