segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A ARTE DA PRUDÊNCIA - 76



Não estar sempre na chacota.

A prudência reconhece-se pela seriedade, que tem maior crédito que o talento. Aquele que está sempre na chacota não é deveras um homem. Comparamos estes aos mentirosos por não acreditarmos neles; a uns por receios de mentira, aos outros da sua chacota. Nunca se sabe quando falam com tino, o que é o mesmo que não o ter. Não há maior desaire que o chiste contínuo. Outros adquirem fama de engraçados e percem o crédito de prudentes. A jovialidade deve ter o seu momento, e a seriedade todos os demais.

A Arte da Prudência
Baltasar Grácian

sábado, 27 de novembro de 2010

VENCIDO E EM FUGA


O presidente da Câmara de Coimbra, Dr. Carlos Encarnação, dá hoje uma entrevista ao Diário as Beiras, em que se apresenta, de uma forma clara, como um presidente vencido e em fuga.

Num tom de lamúria, assume a desresponsabilização pela absoluta falta de visão, de ideias e de projectos, culpabilizando terceiros pela vacuidade da sua capacidade de expressão política, assumindo o único mérito de vir a deixar, no fim de três mandatos, algumas obras idealizadas por outros.

É difícil encontrar num presidente de Câmara deste país um discurso tão fraco e deprimido, para mais quando ainda não chegou a meio do mandato.

Até chega a ser patética a resposta que dá, na conclusão da entrevista, sobre a sua decisão de nomear e manter como director municipal o presidente da Académica, por três anos e não dois como refere, sabendo como feriu, com a sua decisão e as suas omissões sobre o assunto, a honra e dignidade da Câmara e obviamente de Coimbra, apesar de todos os alertas que lhe foram pública e expressamente feitos.

Percebe-se hoje, melhor do que nunca, que o Dr. Carlos Encarnação não está a fazer nada na Câmara de Coimbra e que a todo o momento, caso apanhe um simples constipação, deixará o cargo, até porque o PSD não tem moral para lhe pedir mais nada, mesmo que lhe forneça um anti-gripal...

O problema é que os munícipes de Coimbra o elegeram para um mandato de quatro anos e por isso têm toda a moral para lhe exigir que o cumpra e que não se entretenha a preparar uma fuga airosa.

A derrota interior do Dr. Carlos Encarnação foi-nos apresentada hoje, em letra de forma, e a fuga vai ser trazida daqui a algum tempo com base numa mistificação.

A herança que vai deixar à cidade é muito pesada, sobretudo porque deixará um rasto de destruição de valores e de procedimentos éticos que eram um dos grandes patrimónios da sua Câmara.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

ERA PRECISO QUE O PS SE LEVANTASSE DO CHÃO...


Não é possível invocar James Joyce e o seu Ulisses para perceber o que se passa na Irlanda, mas que há ciclopes da ignorância que andaram anos a fio a matraquear-nos sobre os méritos do modelo de desenvolvimento irlandês e, inclusivamente, a elogiar a campanha anti-Europa conduzida e financiada por um especulador financeiro, que mais não era que um cavalo de Tróia de interesses americanos, isso é possível relembrar.

Mas também é possível reconhecer o desplante e o despudor de muitos desses - bem pensantes  e bem  informados políticos, economistas e fazedores de opinião - que hoje aparecem a referir a inconsistência do seu anteriormente tão apregoado modelo e a criticar o sistema bancário que por ali garantia níveis de vida artificiais utilizando produtos tóxicos.

Diziam, na altura: "Abençoada Irlanda - um verdadeiro tigre europeu - que não investe em auto-estradas ou infraestruturas físicas, mas que garante incomparáveis padrões de desenvolvimento.".

Ouvimo-los, vezes sem conta, atirarem-nos com este panegírico, também ele tóxico, assim como os vamos ouvindo agora transformar a Irlanda num Caronte que nos transporta na sua barca rumo aos infernos.

Nem nós nem a Irlanda merecemos tão "inteligentes" comentadores e analistas, mas muito menos tão abalizados economistas a quem não seria possível entregar a gestão de uma simples mercearia porque a levariam rapidamente à falência.

Aliás, neste momento não só nos preparamos para financiar a Irlanda, melhor dito, e com raiva, os bancos irlandeses e decerto o famoso especulador que pagou campanhas contra a Europa, como vamos ter de pagar por muitos anos juros extremamente elevados, por insondáveis efeitos de contágio, que não penalizarão os especuladores e os senhores dos mercados mas sim aqueles que ainda conseguem ter trabalho.

Ah, os famosos e sapientes economistas e comentadores continuarão com o seu habitual exercício de "superior" inteligência e a sua expertise- de esperteza -, a dizer-nos porque é que temos de pagar a crise, ainda que a maioria deles ganhe com ela pelos artigos que escreve e as análises que doutamente apresenta. 

Só é pena, uma dolorosa pena, que muitos políticos se deixem embrulhar por estes "estudiosos" e não abordem a política com uma atitude prospectiva e uma visão superior, demonstrando alguma capacidade de enfrentar e condicionar o poder económico. Digo alguma capacidade, sublinhando a palavra alguma.

É que está claramente visto que, perante a incapacidade política global, reinante na Europa, vão ser os tecno-economistas que colocaram o trevo irlandês nos píncaros e que agora  lhe arrancam as folhas  que tudo farão para nos importar as desgraças irlandesas.

Dizem e com razão, que a crise é de origem financeira,  mas é também e fundamentalmente uma crise política em que são visíveis o medo e a cobardia dos líderes políticos perante os senhores da finança e em que não se percebe o silêncio dos partidos políticos, concretamente o PS que não dá sinais de uma qualquer capacidade de expressão política perante a gravidade dos factos e as suas consequências por décadas.

Era preciso que o PS se levantasse do chão a que foi atirado e que no mínimo reagisse com a convicção das ideias que estão no seu ideário e na génese.

É que é óbvio o ruir de parte importante do Estado Social que tantos anos levou a construir e é dramático assistir a essa destruição perante a impotência política e a incapacidade de mobilização ideológica.

Possivelmente haverá por aí quem comemore bebendo um bom uísque irlandês. Só espero que não segure o copo com a mão esquerda.

sábado, 13 de novembro de 2010

A ARTE DA PRUDÊNCIA - 75


Escolher um modelo nobre, mais para o superar do que para o imitar.

Há exemplos de grandeza e textos abrilhantados pela reputação. Proponha-se como modelo, cada um na sua ocupação, aos de maior mérito, não tanto para os seguir mas para os ultrapassar. Alexandre chorou, não por Aquiles sepultado, mas por si antes de alcançar a fama. Nada excita mais as ambições na vontade que o clarim da fama alheia. O mesmo que abate a inveja alenta a nobreza.

A Arte da Prudência
Baltasar Gracián

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

POR AMOR DAS CIDADES


Apesar de já ter uns anos (1997) a obra "Por Amor das Cidades - Conversas com Jean Lebrun" de Jacques Le Goff, merece a pena ser revisitada.

Para aguçar o apetite transcrevo o começo da "Conclusão o fim da cidade ou a cidade sem fim.":

"Baudelaire disse: "A forma de uma cidade muda mais depressa, infelizmente, do que o coração de um mortal." No entanto, a continuidade está marcada em certas formas. A Idade Média deu à cidade, ou à maioria das cidades, um espaço rodeado de muralhas cuja traça subsiste mesmo depois dos muros terem desaparecido. Por outro lado, mantém-se a mesma disposição entre uma cidade propriamente dita, o que na Idade Média se chamava cité, e os burgos que se tornaram a seguir os chamados faubourgs; portanto, a articulação centro da cidade-bairros-suburbúbio. A função política, para a cidade de hoje, reveste mais importância do que na Idade Média. À época, a cidade como centro de poder não exerceu o domínio que seria de esperar. Frequentemente, o poder situava-se num lugar mais ou menos dissociado da cidade, o palácio, o castelo, um pouco afastado. Paris só se impôs com a Revolução francesa. E o mesmo se pode dizer de outros países que não a França, onde o estatuto das capitais só tardiamente se cristalizou. O papel de centro monetário financeiro que entenda-se, se afirmará com o capitalismo, surge na Idade Média e prossegue. A cidade é sempre o lugar de reunião e de irradiação dos peritos em leis. Também lá se encontram os poderosos e os dotados de inteligência e de cultura: é sabido que a riqueza não é o único critério de poderio urbano. Contudo, uma grande parte destas funções, desta imagem, é hoje posta em causa, tal como antes era posta em causa a função de produção artesanal e depois industrial da cidade.

Considere o papel festivo da cidade, que deveria manter-se parte integrante da sua função cultural. Acabo de receber a lista dos festivais de música da Primavera-Verão 1997, quase todos se realizam em quintas, em antigos conventos mais ou menos isolados, afastaram-se da cidade. A festa sai da cidade, da grande cidade, sobretudo. Quase diria o mesmo quanto à educação. Permanece ainda, em grande parte, nas cidades, mas muitas instituições situam-se fora.

Neste aspecto, os Estados Unidos deram-nos o exemplo de todas essas falsas cidades que não passam de campus com pouca coisa em redor. Princeton não é verdadeiramente uma cidade. Onde se constrói aeroportos e estádios, não é fora das cidades? Muitas vezes, precisamente onde os estudantes da Idade Média se permitiriam fazer piqueniques..."

sábado, 6 de novembro de 2010

A JUSTIÇA DE PASSOS


Este fim de semana, mais do que as condições meteorológicas, há dúvidas que nos vão atormentar e moer o bestunto: a responsabilização civil e criminal, preconizada por Pedro Passos Coelho, para os responsáveis políticos que não cumpram as suas promessas nem respeitem os orçamentos, é para valer a partir de quando? Tem efeitos retroactivos? Como é que se pode desencadear o processo?

Mais, esse princípio do julgamento judicial por decisões políticas, para além do Governo também é aplicável ao Presidente da República, aos Presidentes dos Governos Regionais e aos Presidentes de Câmara?

Estou ansioso por chegar a segunda-feira com informação mais detalhada. Se entretanto alguém tiver mais informações agradeço que me diga, gostava de avançar com uns processozitos, ao abrigo da "justiça do Passos". 




sexta-feira, 5 de novembro de 2010

MINHOCA POLÍTICA


Confesso que é tudo muito difícil de entender na minha cidade. É sobretudo difícil entender o silêncio. Primeiro o silêncio dos que pensam e sabem mas que não querem dizer - medo? Depois o silêncio dos "faladores", o silêncio de todos aqueles que vão teorizando política e economicamente, que conhecem todos os segredos e todas as soluções e que conhecem todos os culpados, quando estes estão longe, é claro, mas que calam o que vai aqui por casa.

Vejamos alguns exemplos. Olhe-se para duas empresas municipais:  "Turismo de Coimbra" e "Águas de Coimbra". Reflicta-se sobre a génese da sua criação, os sábios argumentos que a sustentaram  e olhe-se para os resultados. Vejam-se os custos/beneficio para Coimbra que a sua criação e funcionamento implicam  e depois contabilizem-se os encargos já suportados, com os nossos impostos, em administrações, assessores, marketing, etc., etc., etc.

Um terceiro exemplo é o do "Metro Mondego". Quando se lê o valor do vencimento dos membros do Conselho de Administração e as viaturas que foram adquiridas para o seu serviço ficasse siderado e arrepiado.

Seja lá quem for, venham lá que argumentos vierem, há quem se sinta insultado nesta terra com estas coisas. Mais, há quem se sinta insultado com os comentários, as opiniões  e os superiores entendimentos sobre a situação económica do país de alguns dos protagonistas criadores e usufrutuários directos das benesses dadas "naquelas coisas".

Perante tudo isto seria pedagógico que, aqueles que criticam tudo o que se passa para lá da ponte, fossem capazes de explicar o seu silêncio sobre o que se passa intramuros.

Depois, porque há por aqui uma enorme hipocrisia e cobardia não se queixem  de que Coimbra seja vista como uma minhoca política.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A ARTE DA PRUDÊNCIA - 74

Não ser intratável.

As verdadeiras feras estão nas cidades. Ser inacessível é vício dos que se desconhecem a si próprios, daqueles que, com as honrarias mudam os humores. Enfadar, por princípio, não é um caminho para a estima. É preciso ver um desses monstros intratáveis com a sua agressiva impertinência sempre pronta! Aqueles que, por desgraça, dependem deles, começam a falar-lhes como se estivessem a lidar com tigres, armados de pau e receio. Para subir de posto agradaram a todos, mas, uma vez conseguido, querem desforrar-se enfadando toda a gente. Pela sua ocupação devem relacionar-se com muita gente, mas, pela aspereza e arrogância, todos lhes fogem. Para estes, o melhor castigo é deixá-los estar, evitando prudentemente a convivência.

A Arte da Prudência
Baltasar Gracián